24.9.09

“Maria Alejandrina Cervantes, de quem dizíamos que só havia de dormir uma vez para morrer, foi a mulher mais elegante que conheci, e a mais completa na cama, mas também a mais severa. Tinha nascido e crescido aqui, e aqui vivia, numa casa de portas abertas com vários quartos de aluguer e um enorme pátio de baile com cabaças de luz compradas nos bazares chineses de Paramaribo. Foi ela quem estoirou com a virgindade da minha geração. Ensinou-nos muito mais do que devíamos aprender, mas ensinou-nos acima de tudo que nenhum lugar da vida é mais triste do que uma cama vazia.

Santiago Nasar perdeu o tino desde o momento em que a viu. Eu avisei-o: Falcão que se atreve com garça guerreira, perigos espreita. Mas ele não me ouviu, aturdido pelos silvos quiméricos de Maria Alejandrina Cervantes. Ela foi a sua paixão destrambelhada, a sua professora de lágrimas aos quinze anos, até que Ibrahim Nasar lho tirou da cama à correada e o encerrou mais de um ano no Divino Rosto. Desde então continuaram ligados por um afecto sério, mas sem a desordem do amor, e ela tinha-lhe tanto respeito que não voltou a ir para a cama com ninguém se ele estivesse presente.

(…)
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De repente senti os dedos ansiosos que me desapertavam os botões da camisa, e senti o cheiro perigoso do animal de amor deitado atrás de mim, e senti que me afundava nas delícias das areias movediças da sua ternura. Mas parou de chofre, tossiu de muito longe e safou-se da minha vida.
- Não posso – disse -: tu cheiras a ele.”


Gabriel Garcia Marques,
Crónica de uma morte anunciada
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