14.3.08

O que é que as mulheres querem?

VENENO 07 03 2008 18.44H

Até Freud desistiu. Deve ter sofrido imenso ao admitir a derrota, debruçando-se sobre a resma de folhas pousadas na mesa, e vendo-se obrigado a escrever que, por muito que pesquisasse e estudasse, não conseguia compreender as mulheres. Para provar que a tarefa a que se tinha proposto era impossível, acrescentou que nem as próprias se conseguiam entender a si mesmas.
Pobre Freud, que todas as semanas levava um ramo de flores à mãe, que o venerou como o seu filho favorito até ao fim da vida; que se via rodeado dos favores das irmãs educadas a prestar-lhe também vassalagem, e contava com Marta, a mulher a quem escreveu todos os dias do noivado, para depois aparentemente deixar de a achar à altura dos seus pensamentos mais intelectuais, mal a senhora passou a dedicada esposa, dona de casa e mãe. Isto para não falar na outra mulher da sua vida, a cunhada, e mais tarde a filha Anna, que o adulava e seguia todos os seus passos, tornando-se também psicoterapeuta, substituindo a esposa em tudo, nas viagens, nas conferências e até nos meses finais do cancro que o matou. Para além das delegadas do sexo feminino que tinha em casa, Freud tinha «colegas» e discípulas de que se orgulhava, embora desconfie eu, sem perceber nada do assunto, que as olharia como um «terceiro sexo», dadas as suas capacidades intelectuais, liberdade de movimentos e de pensamentos. Mas, apesar de todo este convívio, não as entendia. Compreende-se, não eram casos simples, porque não há nenhuma mulher que o seja.
Mas ficaria certamente espantado se fosse hoje a um encontro de psicanalistas e descobrisse que uma grande parte da assistência é composta de mulheres, a partilharem as suas palavras e a praticarem a sua arte.
Freud tinha provavelmente razão. As mulheres são muito mais complexas do que os homens. Nada é linear, nem tão transparente como parece, como aliás era impossível em seres uma capacidade extraordinária de fazer vinte coisas ao mesmo tempo, e todas bem. Hoje são elas que terminam, em maioria, o décimo segundo ano e os cursos universitários; são mais as mulheres, pelo menos as portuguesas, a completar doutoramentos, e se não há equivalência de todo este saber no mundo empresarial, ou pior ainda, na política, é por outras razões que não a falta de apêndices anatómicos que o pai da psicanálise considerava fundamentais. Contudo, chegar aqui tem um preço, que pagam sozinhas, e se impõem a si próprias, como se fosse uma multa que as liberta da culpabilidade que as suas capacidades lhes provocam.
O amor continua a ser a área mais pantanosa. Cometendo a imodéstia de me citar a mim própria, já há muitos anos dizia, no Guia para Ficar a Saber ainda Menos sobre as Mulheres, que o nosso problema é que escrevemos ao mais ínfimo detalhe o guião perfeito da nossa relação amorosa. Sabemos exactamente como é que queremos que o príncipe encantado seja, a cor do seu cavalo, e a marca da sua espada, redigimos as «linhas» que em cada momento deve recitar, e a única coisa que desejamos realmente é que se afaste o menos possível do argumento. Mas, tudo tem um segredo, e aquele que eles devem guardar até à morte é que sabem que se limitam a representar um papel, procurando agir, sempre, como se tudo fosse espontâneo e saído da cabeça deles, como se a iniciativa fosse apenas suas, sem cair na asneira de perguntar directamente onde é que queremos ir jantar no dia em que fazemos dez anos de casados, ou se preferimos um vestido verde ou amarelo. Nas histórias que nos contaram em pequeninas, os heróis sabiam tudo isso e muito mais. Porque, pensando bem, Freud estava enganado, que me desculpe o senhor.

As mulheres sabem muito bem o que querem, não estão dispostas é a revelá-lo, porque desejam profundamente que os homens façam a descoberta sozinhos. Será assim uma exigência tão grande?


Isabel Stilwell

1 comentário:

miranda disse...

se Freud não o descobriu haverá outros com apêndices suficientemente no sítio para descobrir?